domingo, 27 de junho de 2010

Versos não lidos

Ela andava distraída sem notar as pedras no chão. Tentava se recordar daquela música, ficou na cabeça por horas. Juntava alguns fragmentos mas não saía daquele mesmo ritmo. Foi por pouco que seus pés não levaram uma pétala interrompendo sua dança com o vento. O sol ardia na pele e refletia em seus cabelos semi-soltos. O doce era tão Manuelle ao mesmo tempo Manuelle tão doce. Quase redundante. Olhos brilhantes, na boca um hálito de avelã. E a saia que de longe era vestido combinava com o céu, na verdade era um tecido só. Preso por um laço de abas, tão grandes lembrando asas. Deve ser por isso que parecia voar a oeste.

Trazia nas mãos um pedaço de papel. Bonita com menina versos, menina com bonitos versos. Não se sabe ainda se a menina levava o papel, ou se o papel levava a menina. Nem calmos, nem às pressas. O chão já quente eram evitados por seus pés descalços que agora mais perto de seu destino estavam.


As mãos já podiam tocar a bela porta entalhada em marfim que possuia um encaixe imperfeito para a fechadura aveludada. As mesmas mãos que tocaram suavemente num som maciço. Voltou os olhos a cima de sua altura reparando na janela e uma tramela quase fechada. Foi quando o pesar levou-a a agachar-se frente à porta e empurrar os versos que o suor de suas mãos borrou levemente por de baixo dela. A porta passou a recuar-se de Manuelle. Eram as mãos de Juan que a puxou e com um gesto simples se desculpou pelo atraso ao ouvir seu toque.

Os olhos singelos da menina percorreram as vestes do menino que revelavam estar despreparado para a visita. Antes que ele soltasse um sonoro "Manuelle", talvez simultaneamente, ela uniu a útima coisa que ouvira,  suas próprias mãos na porta e acrescentou o timbre tímido de Juan agora dizendo seu nome e não saldou seu amado. Disparou a cantar a música que tanto queria lembrar.

Oh, I thought the world of you

I thought nothing could go wrong

But I was wrong
I was wrong

Ao perceber a expressão maravilhada do menino, a menina deu-se conta que já havia dito tudo e os versos seriam vãos. Tomou o papel e prendeu no laço da saia nas costas sem que ele pudesse ver.
O menino então teve certeza de seu amor pela menina da saia azul.

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