segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Perder-se no Labirinto das Letras

Não me cansei das metáforas. Poderia dizê-lo de mil maneiras, e aferi-lo a mil pedras ou a mil pássaros, mas a verdade é que esse texto é seu, como todos os outros que foram ou não escritos. Era inimaginável, todas as prosas eram duplamente suas, e o próprio ato de escrever era feito como se eu o fizesse no seu ombro, por entre os seus cabelos. Cada prosa foi mais peculiar que a outra e, com o tempo, comecei a te esconder. Começava a escrever, digamos, sobre o frio, mas sabia que nas entrelinhas, ou num pequeno ponto final, escondia você, tenra, com seus grandes olhos de raios furtivos. Começava a escrever sobre a escuridão e te escondia numa lâmpada de opalina que estava lá, a ser acesa. E de brincar assim, uma vez eu te perdi. Falava sobre a luz e te escondi em alguma palavra da qual não me lembrava. Procurei-te em todos os acentos, em todos os N’s, e sorri um sorriso aberto e quente quando notei que havia te escondido no próprio branco da página. Quando percebi o risco, passei a nos esconder, e de repente estávamos correndo por entre as letras como em um sinestésico labirinto de tinta.

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

O nada

Espanta-me a espontaneidade das idéias. Outro dia vi, cambaleando entre os becos de uns prédios, um anjo embriagado. Ser-te-á de grande sorte um encontro desses, sabes que tão raro é planarem baixo. Perguntei-lhe por que não voava. Disse-me “Estou muito triste, Marieta não devolve os meus olhares. Escrevi um poema, e ia deixar cuidadosamente em seu quarto quando me prensaram as asas na janela. Foi, de certo, a sua prima. Além disso, tentei subir e enrosquei nos exaustores de uns prédios – ai, como dói!”. E lhe digo leitor, não me surpreendi. Porque de fato, nada disso aconteceu. Mas essa foi, com certeza, uma bela introdução.
O que realmente me acontece é o que chamo de dor literária. Às vezes eu estou subindo as ruas que levam da minha casa até a rodoviária, e me vem uma ânsia de espirrar essas palavrinhas de sempre. A vontade, esses dias, foi da palavra “selênica”. Queria atribuí-la a uma criança, mas ao perceber que deveria pincelar-lhe um cenário místico, um propósito e outros adjetivos, acabei dormindo. De qualquer forma, já a usei aqui. A minha dica? Saiba utilizar as idéias. E me ensine a fazê-lo também – estou cansado de perdê-las e doá-las a outros escritores, como a palavra “Ametista” que eu doei para descrever os olhos de uma personagem de um amigo. Isso tudo, por não escrevê-las quando as penso. Se pudesse escorrer tinta dos lábios e tatuar nas costas, enquanto balbucio as linhas do texto, seria o ideal. Se pudesse nem escrever, ainda melhor. Mas vem essa dor, rói os ossos dos dedos e escreve por mim.
Quis descrever o céu do parque, mas me passou um corvo; quis descrever o corvo, mas surgiu um homem e o seu bigode. Voltei para a casa. Agora, escrevendo sobre o episódio, começou a chover, molhando a ave e o bigode na história. Uma menina que iria aparecer ficou com medo dos trovões, não saiu e não conheceu o meu herói. Assim me fogem as idéias, como a areia por entre os dedos, como o vento a assoviar por entre os fios de cabelo. Queria dizer que é do anjo ou da Marieta, mas, no fim, devo me perdoar – esse é só mais um grande texto sobre o nada.
E eu nem sei se Marieta é mesmo um nome...

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

O céu peculiar de hoje

O tempo me escapou dos olhos num fenômeno raro. Penso tê-lo citado uma vez a ti, numa tarde em que as nuvens caíram baixas e oblíquas, o céu entoou um vermelho sobre a minha cidade, e choveu forte. Era-me certo que as faixas vermelhas nas bordas do horizonte eram cidades iguais a minha, onde as coisas espelharam o mesmo tom, como a água e os pequenos troncos de um aquário sob o néon. Era-me certo que nesse dia as mesmas bordas estavam todas esbranquiçadas; caía-me a poeticidade de que delas alguém apontava sabendo que a cor e o sol dormiriam hoje no canto de cá.

Atribuo-me, também, noutra citação. Afirmei-te que, por mais colérico que estejas, o céu tem a capacidade de incitar os sorrisos em seu espetáculo. Hoje, porém, me provei errado. Sequer o notei, ao ponto de que as nuvens já se dissipavam e já crescia a escuridão da noite, e o culpado foi o próprio tempo que escapou dos olhos. Ele me roubou o sorriso do céu, mas falhou miseravelmente em tomar o sorriso que me traz a sua voz, que veio quando eu disse, por um motivo qualquer, uma palavra com a entonação que você a deu. Pudesse, ecoava a mesma palavra no céu vermelho até que ela perdesse seu sentido. Essa palavra é “Muito”. E me acendeu a necessidade e a existência de mesclar não a palavra ao céu, mas você à palavra.